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sexta-feira, 22 de julho de 2011

22/07– A desindustrialização, segundo Ivo Rosset

Governo não age para evitar a desindustrialização, diz Ivo Rosset


Ivo Rosset, dono da Valisére e da Cia. Marítima, em seu escritório no Bom Retiro – Foto Rodrigo Capote/Folhapress

A indústria têxtil brasileira vive sua maior crise e, se nada for feito pelo governo no sentido de reavivá-la, 2,5 milhões de empregos correm o risco de evaporar em questão de poucos anos.
O alerta é de Ivo Rosset, proprietário do Grupo Rosset, que detém 65% do mercado de produção de tecidos no país e também as marcas Valisère e Cia. Marítima.
O elo fraco da cadeia que alimenta essa indústria, de acordo com ele, está no setor das confecções (corte e costura dos tecidos para a produção de roupas), que têm sofrido com a concorrência das mercadorias chinesas, mais baratas e nem por isso com qualidade inferior.
"Nada foi feito nos últimos 20 anos. O país está caminhando para a desindustrialização e o governo não está agindo", afirma.

Rosset é um dos empresários com melhor trânsito em Brasília. Encontrou-se com Lula e com Dilma diversas vezes. Conversa frequentemente com o ministro Guido Mantega. Foi um dos primeiros empresários a apoiar o PT e filiou-se ao partido em 2009.
Há um mês, esteve na capital federal como representante do setor têxtil, quando apresentou uma proposta de aliviar a carga tributária das confecções adotando o regime do Simples como imposto único, independentemente do faturamento.

Folha - Como vai a indústria têxtil no país?
Ivo Rosset - De um lado, temos a produção de tecidos, que também sofre com a concorrência chinesa. Como o segmento de tecido plano (produção de tecidos para camisas sociais, por exemplo). Várias fecharam em Americana, que é um grande centro de produção.
Existia também um mercado enorme para produtos como a viscose com fio elastano. Mas os chineses entraram a um preço que não dava para competir. Todos que produziam pararam. E as grandes malharias no Sul estão com problema, elas eram muito mais fortes do que hoje.

E as confecções?
A confecção é o polo que está mais focado na competição com a China. Se não resistir, vai atingir o setor como um todo, pois são as confecções que compram os tecidos que produzimos. Comparando a situação de uma costureira brasileira com a chinesa, a distorção é enorme. Aqui, um funcionário custa para o empregador 2,4 vezes a mais que o salário dele. Por isso propomos o regime do Simples -dessa forma as confecções pagariam 12% sobre tudo.

Por que só as confecções?
Conversando com a presidente, dei um exemplo. Uma empresa de confecção com 2.000 pessoas talvez fature o equivalente a 5% de uma indústria automobilística que também tem 2.000 pessoas. E a confecção não vai suportar a concorrência chinesa. É uma cadeia que emprega muita gente e está destinada a desaparecer caso não se faça algo com muita urgência. Estamos falando de 2,5 milhões de empregos diretos e um universo de 8 milhões.

Em que estágio estamos?
Crítico. Toda rede varejista importava de 5% a 10%, agora é de 35% a 40%.

Há gente quebrando?
O pessoal vai fechando. Muitos estão saindo do Brasil e indo para a China. Outro dia conversei com um fabricante de um outro setor, da Mundial, do Rio Grande do Sul. A ação dele disparou na Bolsa porque sua rentabilidade aumentou. Ele fechou tudo que tinha de produção no país e foi fabricar na China. Estamos matando emprego nosso e dando emprego pra chinês.
A Marcopolo [fabricante de ônibus] foi embora, está produzindo em outro lugar e mandando os ônibus para cá. Vai chegar um momento em que ou transfiro as atividades da Rosset para fora ou sei lá o que vai acontecer.

O que mais pode ser feito?
Nós estamos dentro de um modelo que não muda há 20, 30 anos e que só teve aumento de carga tributária. Na China, eles têm quase 80 milhões de pessoas empregadas nesse segmento. Não sou favorável ao método deles. Dão albergue e comida às pessoas, mas não pagam previdência. E o salário não passa de US$ 100, enquanto aqui é de US$ 1.000, fora a carga tributária. Nosso funcionário é mais eficiente que o chinês. Só que o sistema não ajuda.

O sr. está se referindo à moeda forte e à taxa de juros?
Estamos assistindo ao filminho sem fazer nada. Pior que isso, há Estados como Santa Catarina que incentivam a importação baixando o ICMS. Essa é a maior afronta ao Brasil que já vi.

O país está caminhando para a desindustrialização?
Total. A questão é: queremos ou não ser um país industrializado? Se sim, as medidas precisam ser imediatas. Se não, vamos nos tornar um país de serviços. Só que vamos pagar um preço muito alto lá na frente. Veja o que aconteceu com os Estados Unidos, com o desastre da indústria automobilística, por exemplo. O país agora chora os empregos perdidos e não consegue reempregar.

Existe abandono do setor pelo governo?
Não diria abandono, mas diria que o governo está sem saber direito o que fazer. Eles ouvem, mas não vejo ação. Não sei qual a dificuldade que existe, se é burocracia.

E o BNDES?
Não adianta dar cortisona, é preciso repensar o modelo. Aplicar o Simples a todas as confecções, sem limite de faturamento, é uma mudança radical. Daí, sim, o BNDES pode entrar. E não são grandes investimentos, é coisinha pouca, bem menos do que a fusão do Abilio [Diniz, do Pão de Açúcar].

Fonte: Folha de Sao Paulo

quinta-feira, 14 de julho de 2011

14/07– Os desafios da venda de vestuário pela Internet

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A maioria das pessoas concorda que o setor de vestuário chegou ao fim do caminho no que se refere à queda nos preços de produção. Mas será a Internet a próxima grande oportunidade dos confeccionistas reduzirem os custos da cadeia de logística?

Uma questão para a qual Mike Flanagan, CEO da Clothesource Sourcing Intelligence, uma consultora britânica especializada no setor do vestuário, dá resposta neste seu artigo.

Os preços de produção de vestuário não pararam de cair apenas porque os salários e os preços das matérias-primas estão a subindo. Esta subida verifica-se também porque esgotamos praticamente todos os benefícios de redução de custos resultantes da deslocação da produção ao longo dos últimos 20 anos.

Até ao dia 1 de Janeiro de 2009 – data em que as quotas alfandegárias foram efetivamente levantadas sobre as importações chinesas de vestuário nos EUA e a UE deixou de exigir licenças de exportação ao vestuário proveniente da China - sempre existiram limites às importações de vestuário.

Essas restrições demoraram décadas até serem eliminadas, mas, no final de 2010, os compradores ocidentais estiveram perto de conseguir o máximo possível dos baixos salários asiáticos. Mas não completamente.

As empresas asiáticas continuam a investir em novas infra-estruturas e os países importadores continuam a alterar as suas regras de importação e por isso os melhores locais para um bom valor em 2009 não serão necessariamente os melhores lugares em 2011.

A realidade é que chegamos ao fim de uma era muito longa. Durante grande parte dos últimos 250 anos, a indústria têxtil e vestuário registou uma série de inovações técnicas e legais, que tiveram o efeito de diminuir constantemente os preços da produção do vestuário.

A Revolução Industrial começou com a mecanização da fiação e tecelagem: vias ferroviárias e navios a vapor foram inicialmente desenvolvidos para acelerar o transporte de algodão dos Estados Unidos para as fábricas de Manchester.

A deslocação da produção de vestuário ao longo dos últimos 15 anos para lugares até 20.000 quilometros de distância do cliente final, foi apenas o último passo de um processo que começou em meados do século XVIII com a invenção da fiação e tecelagem mecanizadas.

Poderá realmente acontecer que, com a implementação final de um regime sem quotas em 2009, o ciclo de contínua redução de custos tenha chegado finalmente ao fim?

Bem, no que se refere à produção de vestuário, provavelmente sim. Mas é claro que a produção e o transporte do vestuário e das suas matérias-primas, são apenas uma parte do custo de uma peça de roupa.

A Gap, por exemplo, adiciona em média uma margem de 70% ao custo de uma peça de vestuário desembarcada nos EUA, para pagar o manuseamento, a armazenagem e os desperdícios, os salários das pessoas envolvidas nesses processos - e os dividendos que paga aos seus accionistas. Muitos confeccionistas adicionam uma margem ainda maior.

E, para muitos confeccionistas, houve pouca redução nos últimos 20 anos na margem que precisam para prestar os seus serviços. Assim sendo, será que o custo de confecção de vestuário vai ser a próxima área que as novas tecnologias vão revolucionar?

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Oportunidades on-line
É claro que em muitas indústrias, tal questão não vale realmente a pena ser colocada. A Amazon devastou livrarias especializadas, enquanto os supermercados e a Internet praticamente eliminaram as lojas de música convencionais. Os agentes de viagens são quase uma coisa do passado.

Mas a web teve até agora um efeito bastante diferente na venda de vestuário. De forma geral, as opções do consumidor aumentaram, tornou a compra de roupas mais conveniente e ajudou os confeccionistas a alcançarem os compradores que não conseguem chegar às lojas. Mas quase não diminuiu os custos de todo.

Para as vendas internas, o custo do correio ou entrega postal é geralmente mais caro do que manter uma loja numa localização privilegiada. Para a maioria das vendas externas, os clientes encontram-se frequentemente confrontados com uma conta que engloba direitos de importação, imposto de vendas e administração de entregas.

Confeccionistas e fornecedores de serviços têm trabalhado arduamente para tornar a aquisição de roupas via Internet mais uniforme. Mas é justo dizer-se que não existe qualquer indicação que, durante este século, uma Amazon ou Spotify possa implicar o desaparecimento iminente das lojas da Gap ou Zara.

Estaremos todos  perdendo algo gritantemente óbvio? Deve haver certamente algum empresário visionário chinês que, neste preciso momento, está construindo um armazém, onde trabalhadores com baixos salários reúnem encomendas de clientes via web, colocando-as em embalagens de transporte robustas, que serão expedidas por FedEx para que cheguem à caixa de correio de um cliente no Ohio, 24 horas mais tarde – tudo por apenas uma fracção do custo de funcionamento de milhares de lojas físicas.

Será que a fronteira final da indústria de vestuário vai ser a eliminação virtual dos custos de confecção?

Para pensar….